Herbert Spencer
Para Spencer, havia uma regra fundamental da matéria: a lei da persistência da força
Frase de Herbert Spencer:
“A educação deve formar seres aptos para governar a si mesmos e não para ser governados pelos outros”
Herbert Spencer nasceu em Derby, Inglaterra, em 1820, e desde a adolescência mostrou ter uma personalidade anti-conformista. Aos 13 anos, tentou fugir da educação oferecida por um tio que era pastor protestante, mas teve que voltar à escola, onde se manteve até os 16. Depois disso, deu continuidade sozinho a sua formação, com leituras que se concentraram acima de tudo em ciências. Queria ser inventor e acabou, pelo conhecimento que adquiriu sozinho, trabalhando como engenheiro ferroviário. Paralelamente, começou a publicar artigos em que já defendia idéias liberais, argumentando que a ação dos governos não deveria ir além de garantir os direitos naturais dos cidadãos. Em 1848, tornou-se subeditor da revista The Economist, onde trabalhou até 1853, quando recebeu uma herança do tio e passou a se dedicar apenas a escrever livros – atividade que manteve até a morte, em 1903. Spencer relacionou-se com os principais intelectuais ingleses de seu tempo e manteve um romance com a escritora George Eliot (pseudônimo de Marian Evans). Sua obra teve enorme repercussão dentro e fora da Grã-Bretanha. Alguns dos principais livros de Spencer são: Filosofia Sintética (que publicou em série, com pagamento de assinatura antecipada por seus admiradores), O Homem contra o Estado, Educação Intelectual, Moral e Física e Autobiografia.
Tendo vivido num tempo de grandes avanços científicos, o filósofo inglês Herbert Spencer foi o principal representante do evolucionismo nas ciências humanas. Ele intuiu a existência de regras evolucionistas na natureza antes de seu compatriota, o naturalista Charles Darwin (1809-1882), formular a revolucionária teoria da evolução das espécies. É ele o autor da expressão “sobrevivência do mais apto”, muitas vezes atribuída a Darwin.
O filósofo aplicou à sociologia idéias que retirou das ciências naturais, criando um sistema de pensamento muito influente a seu tempo. Suas conclusões o levaram a defender a primazia do indivíduo perante a sociedade e o Estado, e a natureza como fonte da verdade, incluindo a verdade moral. No campo pedagógico, Spencer fez campanha pelo ensino da ciência, combateu a interferência do Estado na educação e afirmou que o principal objetivo da escola era a construção do caráter (leia quadro na página 58). “Ele dizia que os conhecimentos úteis, que serviriam para formar os homens de negócios e produzir o bem-estar pessoal, eram desprezados em favor do ensino das humanidades, que davam mais prestígio”, diz a professora Maria Angélica Lucas, da Universidade Estadual de Maringá.
Para Spencer, havia uma lei fundamental da matéria, que ele chamou de lei da persistência da força. Segundo ela, a tendência natural de todas as coisas é, desde a primeira interação com forças externas, sair da homogeneidade rumo à heterogeneidade e à variedade. À medida que as forças vindas de fora continuam a agir sobre o que antes era homogêneo, maior se torna o grau de variedade.
Conhecer, só pela razão
Baseado nessa observação, Spencer deduziu um princípio para todo desenvolvimento, que é a lei da multiplicação dos efeitos, causada por uma força absoluta que não pode ser conhecida pelo entendimento humano. Trata-se, para Spencer, de uma lei da natureza, uma vez que ele se recusava a levar em conta, para efeito científico, a possibilidade de forças sobrenaturais. O filósofo, herdeiro da linhagem empirista britânica e também influenciado pelo positivismo, era agnóstico e combatia a influência religiosa no ensino e na ciência. O próprio termo agnosticismo, para se referir a uma postura filosófica que só admite os conhecimentos adquiridos pela razão, foi criado por um amigo e defensor de Spencer e Darwin, o naturalista Thomas Huxley (1825-1895).
De acordo com Spencer, o processo de desenvolvimento segue a mesma lei em todos os campos, da formação do universo à transformação das espécies. Seu entendimento inicial da evolução biológica se baseava na concepção errônea de que as sucessivas gerações de uma mesma espécie herdam das anteriores as características adquiridas do ambiente. Essa era a teoria do naturalista francês Jean-Baptiste Lamarck (1744-1829), derrubada por Darwin. Ele mostrou que o mecanismo da evolução é a seleção natural, pela qual sobrevivem as variedades animais e vegetais mais adaptáveis às condições ambientais. Tão logo conheceu as conclusões de Darwin, Spencer reformulou sua teoria.
Perfeição industrial
Aplicado à sociedade, o princípio evolucionista universal do filósofo o levou a perceber um processo de individuação permanente, que levaria à crescente divisão do trabalho nos agrupamentos humanos. Desse modo, hordas primitivas e indiferenciadas evoluem para se tornar civilizações cada vez mais complexas, nas quais especialização e cooperação avançam lado a lado. A história dos povos, segundo Spencer, contrapõe sociedades guerreiras, mantidas coesas à força, e sociedades industriais, fundamentadas na competição, mas também na cooperação espontânea.
Um prolongamento da dicotomia entre sociedades guerreiras e industriais, para Spencer, seria o contraste entre o despotismo, associado a estágios primitivos, e o individualismo, associado ao avanço civilizador. A sociedade industrial corresponderia, assim, a um aperfeiçoamento natural do sistema econômico e das instituições.
O pensamento de Spencer corresponde a um desejo, muito vivo em sua época, de explicações globais que organizassem os fatos de modo a simplificá-los. No período, foram produzidas numerosas teorias que hoje chamamos de deterministas, por almejarem, no campo das ciências humanas, a exatidão matemática. A noção de que tudo se encaminha para resultados previsíveis e inevitáveis, uma vez que deixadas ao sabor de seu suposto curso natural, levou Spencer e muitos de seus contemporâneos (e também alguns pensadores de outros tempos, anteriores e posteriores) a supor que esses resultados eram também moralmente desejáveis. Nasce daí a idéia, ainda hoje vigorosa, de que a interferência do Estado na vida cotidiana impede os desenvolvimentos considerados normais. “Spencer acreditava que a lei da oferta e da procura devia estender-se da esfera econômica para a esfera educacional”, diz a professora Maria Angélica.
Ensino dependia da iniciativa privada
Ao contrário do que acontecia na Europa continental, na Grã-Bretanha do início do século 19 o ensino era um assunto privado. A primeira ingerência pública na educação foi uma resolução aprovada pelo Parlamento em 1802, pedindo aos empregadores que providenciassem instrução para seus funcionários – como não havia obrigação atrelada, o efeito foi nulo. Quando não era paga, a educação britânica dependia da filantropia. Só na década de
1830 o governo passou a reservar uma parte do orçamento para o ensino. Na virada para o século 20, no entanto, quase toda a formação elementar (equivalente ao Ensino Fundamental) já era provida pelo
Estado. Herbert Spencer defendeu a escola privada até o fim da vida, porque considerava que a interferência do Estado, sendo igual para todos, poderia sustentar estudantes que não estariam, por natureza, aptos a competir em sociedade. “De acordo com a filosofia spenceriana, seria fatal se o regime da família, em que a solidariedade faz com que o mais apto ajude o menos apto, regulasse a sociedade, onde o que conta é a luta pela vida”, diz a professora Maria Angélica.
Seguindo outra tradição britânica, Spencer acreditava que a função principal da educação era formar o caráter. Sua defesa do ensino prioritário da ciência tinha o objetivo de fornecer aos jovens um conhecimento sobre o funcionamento da natureza que lhes desse meios de se ajustar às exigências do mundo.
Para pensar
Nos dias de hoje, é difícil encontrar seguidores fiéis do evolucionismo de Herbert Spencer, mas muito se fala de uma tendência de pensamento bem semelhante, que é chamada, um pouco caricaturalmente, de darwinismo social. A educação voltada, sobretudo para formar jovens competitivos costuma estar relacionada a essa concepção de mundo. Você já pensou até que ponto sua atuação profissional se vincula à idéia de formar jovens para a competição?
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